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Mostrando postagens de 2021

PRIMOGÊNITOS

  Disseram-lhe, “agora é o mais velho”, e seus ombros juvenis ganharam um peso que ainda nem sabia mensurar. “Você tem que cuidar do seu irmão”. “Meu irmão... mas se parece com um bebê. Não seria essa a responsabilidade dos pais? Cuidar do bebê? Cuidar de mim?” Disseram-lhe, e ali, na fala, na responsabilidade trazida por uma função não pleiteada, criou-se um criança/adulto. Um cargo de primogênitos mas, às vezes, requerido por algum outro irmão. Disseram-lhe, então, mesmo sem saber como, exerce essa tarefa. Numa jornada solitária, confusa, angustiante. Disseram-lhe quem era, muito antes de saber quem é. O quanto será ou não um problema? Pergunte ao tempo. Disseram-lhes... E muitos ainda estão, cuidando, zelando, responsáveis, se não pelo irmão, pelos pais, pelos tios, pelos avós. São quietos, preocupados, porém, sempre ali, aonde foram colocados, como guardiões. Um criança/adulto confuso, um adulto/criança perdido. Um primogênito a quem delegaram uma função. “Agora você é o ir

E DEPOIS?

Haverá espaço ou, até mesmo, querer, pós tantos acontecimentos contidos num curto espaço-tempo? Depois de tanta ausência física?... Como se (re)encontrar depois do tanto que se perdeu? Depois que o oculto foi revelado? As máscaras realmente cairão? Será possível se reconhecer, permitir-se ver fora do chamado virtual? Se já não sabíamos quem éramos, como saber agora? Agora... Como se parecerá o "novo normal"? Empoeirado. Mofado. Destelhado. Vazio. O que restará dentro? Algo permanecerá inteiro ou, com pedaços que lembrem o que um dia foi? Algo passível de ser reconectado? Teremos tato para voltarmos a sermos palpáveis? Abraços. Apertos. Aproximação. Com que olhar enxergaremos o outro, agora que o lemos digitalmente, remotamente, visto por último... Como recolocar no lugar as coisas que vieram pra dentro sem nem pedir licença? Precisaremos de adaptação para ser o que um dia fôramos, mesmo agora, que já não somos os de outrora? Seremos (re)configurados? O que restará para reform

SE ATRAVESSA O CAOS?

  “ Como atravessar o caos e permanecer humano? ” Li em algum lugar, não vou precisar aonde, e nem, de quem... Pois, eu tenho lido. Tentativa de fuga? Ou munição?   Beiramos o meio milhão de mortos... Nos tornamos o balanço negativo de uma planilha estatística. E o abismo-caos-poço não tem fim. Estamos em queda livre num sonho do qual não se acorda porque, adivinhem só, não estamos dormindo. Apenas peões dispostos no tabuleiro vendo as peças caírem uma a uma “ do pó viestes, ao pé retornarás ”.   O que dói? Saber que uma única escolha poderia ter nos dado uma narrativa diferente de boa parte dessa história confusa e cruel da qual sofremos enquanto personagens em clausura.   Distanciamento, máscara e álcool em gel. Um contra todos e, boa parte do todo, contra um... Quiséramos que o nosso maior mal fosse o vírus!   Curioso como da vista da janela, a vida segue seu curso normal. Pessoas, carros, reuniões, aglomerações, multidões... “ Arraste ” para ver mais. O círculo ver

DESASTRE NATURAL

Estamos em meio a uma onda que não se pula, e nem se surfa. Bem semelhante a um tsunami. Perdemos as contas dos dias que acreditávamos ser finais. Ingenuamente, dizíamos: “novo normal”. Esperança... O que esperávamos? O que ainda esperamos? A cura!? Um milagre!? Quem sabe somente respeito pela vida, pelas milhões de vidas. Parar a morte... Parar a fome... Fechar os olhos e quando abrir, ver que a tempestade passou. Que o pesadelo não pode te alcançar, agora que seus olhos estão abertos. Aquele chacoalhar que te desperta, acompanhado de um “estou aqui”.   Não há abraços... Não há voz... Não há despedida...   Esse pesadelo já passou de trilogia. Já é muito mais do que uma sequência ruim. E foi filmado em 3D. Batem na porta, e ninguém atende. Os corpos vão chegando, vão chegando, vão chegando... E são deixados na calçada. Estamos lotados. Não há vagas.   Um grito abafado. Outra pá cheia de terra. - Por favor, um prato de comida!   Festa, festa, e mais fes

COMO É NÃO SE IMPORTAR?

Tenho evitado pensar para não ser avassalada pelas palavras, pelos pensamentos que não permitem que os olhos se fechem, mas, cada pro-nun-ci-a-men-to reflete a dor da facada que não sangrou... Como se calar diante de tantas palavras e inações que “fingem” serem sem propósito. Propósito há, mas não é em prol do bem, e nem de mim ou de você. “E daí?” Não assumir um lado ou crer que só há um lado que reflita o “bem maior”, tem superado o que creiamos ser o fundo do poço. O “eu avisei” deu lugar ao “a culpa é sua”, sim, porque a escolha foi consciente. Queriam alguém que desse vazão aos seus monstros. Queriam e querem muitos dos nossos mortos. E estamos morrendo... Mas, nem imaginam quão fortes os que sobreviverem serão. “Vocês vão ficar chorando até quando?” Quase 300 mil mortos (SÓ por Covid) e nossa dor, como sempre, é resumida a mi mi mi. E há os que defendem o indefensável. Como coloca a cabeça no travesseiro e dorme? Eu estou a meses sem dormir. De mãos atadas. Contando os corpos