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Eu!?



Eu!? Eu sempre detestei espelhos. Sempre me sentei no fundo. Sempre me posicionei atrás nas sequências coreográficas. Eu!? Sempre preferi roupas largas a justas. Sempre optei por cores neutras. Sempre caminhei de olhos baixos e fones de ouvidos. Eu!? Nunca me imaginei destaque. Nunca me entendi bonita. Nunca seria o amor de alguém, mas sempre, a amiga. Eu!? Menina mulher da pele preta. Sempre objeto, nunca afeto. Sempre conselho, nunca plano. Sempre "um dia quem sabe". Eu!? Sempre soube que teria que me esforçar muito mais para ser mediana, pois, o ótimo não era pra mim. Eu!? Sempre achei que tudo bem não gostarem de mim, afinal, eu nem era bonita, nem feminina. Eu!? Sempre tentei caber nos lugares. E nunca fui, por muito tempo, de lugar algum. Vaguei. Apenas existi. Eu!? Por muito tempo me anulei para ser quem queriam que eu fosse. Eu!? Não entrarei em por menores, porque ainda tem gente que acha que a solidão da mulher negra não passa de mais um "mi mi mi", porém, só "o dono da dor sabe o quanto dói", e esse texto não é pra dizer o quanto você está enganado quanto a isso, e a toda a história negra contada por aí. Eu!? Pós 36 anos adormecida, me olhei no espelho, e me vi. Ainda não é uma imagem nítida, mas, vejo o suficiente para quebrar todos os paradigmas impostos sobre mim. E venho quebrando-os um a um, com muita dor a cada espremer de mãos pelos aros das correntes, a cada novo curativo nas marcas das chibatadas. Me (re)construindo e dizendo "não" a cada pensamento que me limita a ser menos do que eu posso ser. E sorrio, de maneira afrontosa, porque (eu!?) descobri que eu sou linda, independente do que os outros venham me impor ou dizer. E, (eu!?) serei a melhor versão de mim mesma. Porque hoje eu sei que sou um mundo em mim, e não mais, uma pessoa invisível. Sou tudo aquilo que me culpei por ser e, que agora, assisto sorrindo eclodir e brilhar. Eu!? Sou tudo isso e nada disso, mas, agora EU, fazendo minhas próprias escolhas (e me sentindo muito bem com isso).

M.P. 08 jun. 2019

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